Ria Formosa
Lisbon by Design • 2022
Respondi ao convite para participar na feira Lisbon by Design com a exposição Ria Formosa, na qual procurei destacar a excelência de algumas técnicas e materiais portugueses. A inspiração partiu de um conjunto de conchas que apanhei com a minha filha na Ria Formosa. As formas, as texturas e as tonalidades das conchas foram retratadas pela artista Henriette Arcelin numa aguarela alusiva ao universo marinho.
Esta ilustração-mãe foi depois usada de forma distinta em cada uma das peças produzidas para a exposição. Em colaboração com a Manufactura das Tapeçarias de Portalegre, criámos a tapeçaria Ponta da Culatra. Pelas mãos da artesã Emília Cristina nasceu a tapeçaria de Arraiolos Sítio do Malhão. Em ambiente de residência artística na fábrica-atelier Viúva Lamego, Henriette Arcelin produziu um painel de azulejos (Cacela Velha) e quatro esculturas em baixo-relevo (Murice, Peixe Lua, Buzina, Vieira-Lula). A artista Maria Emília Araújo juntou-se ao projeto com quatro pratos de sua autoria, inspirados no universo Ria Formosa.
Todas as peças, assim como as conchas e as aguarelas foram apresentadas na feira Lisbon by Design, que decorreu entre os dias 19 e 21 de maio no Palacete Gomes Freire.
TAPEÇARIA DE PORTALEGRE
Ponta da Culatra (2022)
O trabalho das artesãs da Manufatura das Tapeçarias de Portalegre transformou o desenho de Henriette Arcelin numa enorme aguarela colorida, onde não falta nenhum detalhe da ilustração original. A atenção ao pormenor, a técnica única e o respeito absoluto pelo desenho dos artistas são marcas da Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, que Felipa Almeida fez questão de trazer ao projeto Ria Formosa. A tapeçaria Ponta da Culatra resulta de mais de mil horas de trabalho.
Na tapeçaria Ponta da Culatra, foram utilizadas 147 cores lisas, usadas simples e/ou na composição de 96 mesclas. Foram necessárias 756 horas de trabalho de tecelagem até ao desenho final. O trabalho começou muito antes da tecelagem: a partir do desenho de Henriette Arcelin, foi feito um desenho da tecelagem – a transposição do original do pintor para um papel milimétrico próprio -, que demorou 440 horas.
VIÚVA LAMEGO
Nove peças em cerâmica ampliam o universo Ria Formosa: um painel de azulejo (Cacela Velha), quatro esculturas em baixo-relevo (Murice, Peixe Lua, Buzina, Vieira-Lula), assim como quatro pratos decorativos.
O epicentro deste processo aconteceu na fábrica Viúva Lamego, em Sintra, onde Henriette Arcelin permaneceu em residência artística. Em ambiente de fábrica desenvolveu o seu trabalho artesanal, com uma intensa troca de experiências com os técnicos da Viúva Lamego. Foi um processo imersivo e de partilha de conhecimento. Apesar de já ter feito vários trabalhos em parceria com a Viúva Lamego, esta foi a primeira residência da ceramista francesa na fábrica, o que lhe permitiu mudar de escala e testar novos processos. No caso de Cacela Velha, o painel de azulejos foi cortado a partir de uma única lastra, em barro fresco, o que criou enormes desafios técnicos, devido à contração e empeno do material. Também os testes de cor foram aproximando os vidrados da Viúva Lamego da paleta de cores de Ria Formosa, num trabalho continuado de testes, de tentativas até ao resultado final.
Fundada em 1849, a Viúva Lamego desde sempre privilegiou a criação artística e foram muitos os artistas que ali tiveram e têm o seu atelier – como Jorge Barradas, Querubim Lapa, Manuel Cargaleiro ou Maria Emília Araújo, artista residente da fábrica há mais de seis décadas. Numa das muitas visitas de acompanhamento do projeto, Felipa Almeida conheceu a ceramista portuguesa e, impressionada com o seu trabalho, desafiou-a para se juntar. Maria Emília Araújo aceitou o desafio. Desenhou e pintou quatro pratos únicos, juntado o seu imaginário ao de Ria Formosa.
TAPEÇARIA DE ARRAIOLOS
Sítio do Malhão (2022)
Trata-se de um trabalho de pormenor, que começa com a preparação da tela para bordar, delineando o desenho e delimitando as zonas de cor. São 48 horas de trabalho para definir os centros dos desenhos, os limites dos motivos, fazer as contagens de pontos de cada motivo e estudar o plano de execução do trabalho. Nada é deixado ao acaso neste bordado a ponto de cruz. Segue-se a exigente arte tapeceira, de bordar ponto a ponto todo o padrão. Sítio do Malhão tem uma dimensão de 2,10 por 1,05 metros, o que equivale a 422 pontos de comprimento por 212 de largura. Para os bordar, foram necessárias mais de 200 horas de trabalho.
Em Sítio do Malhão, o desenho de Henriette Arcelin respira numa harmonia de 18 cores, executada de forma totalmente manual, em ponto cruz sobre tela. No final do bordado, a tapeçaria foi esticada à esquadria sobre madeira, pregada e molhada. Só depois de seca foram cosidas as bainhas e finalizado todo o trabalho.